Para entender esse fenômeno, é necessário primeiro compreender o que são os JRPGs, sigla para Japanese Role-Playing Games, ou RPGs japoneses. Inspirados nos RPGs de mesa ocidentais da década de 1970, como Dungeons & Dragons, os JRPGs ganharam vida própria no Japão, com características próprias e foco narrativo mais acentuado.
O grande marco inicial do gênero foi Dragon Quest (1986), desenvolvido pela Enix (hoje Square Enix), que introduziu elementos que se tornaram padrões do estilo: combate por turnos, exploração de masmorras e uma narrativa centrada na figura de um herói destinado a salvar o mundo. O sucesso desse título deu início a uma era dourada dos JRPGs nos consoles japoneses.
Nos anos 1990, o gênero se consolidou com títulos como Final Fantasy (1987) e Chrono Trigger (1995), este último considerado um dos melhores jogos de todos os tempos. Com múltiplos finais, narrativa envolvente e um sistema de combate inovador, Chrono Trigger ajudou a consagrar o Super Nintendo como um dos principais berços dos JRPGs clássicos.
Uma das grandes qualidades dos JRPGs é seu foco em narrativas ricas e bem elaboradas, com destaque para o desenvolvimento emocional dos personagens. Um exemplo notável é a franquia Persona, na qual o jogador pode fortalecer os laços com outros personagens, cujas histórias e personalidades únicas enriquecem a experiência do jogo.
Onde está o problema, então?

O grande foco na narrativa traz consigo uma abundância de diálogos. Esses diálogos são essenciais para a imersão e para o aprofundamento no universo do jogo, sendo o principal meio pelo qual o jogador interage com o mundo e os personagens. Porém, na sociedade atual, marcada pela pressa e pela busca por recompensas imediatas, a leitura tem sido cada vez mais negligenciada. As pessoas tendem a consumir apenas títulos e resumos, evitando conteúdos mais extensos.
Esse comportamento afeta diretamente a recepção dos JRPGs. Para muitos, os jogos se tornam cansativos ou “parados” justamente por exigirem paciência, atenção e envolvimento emocional. A gameplay, por sua vez, costuma se basear em sistemas estratégicos de combate por turnos e desenvolvimento dos personagens, o que exige raciocínio e tomada de decisões cuidadosas.
Por exemplo, em Pokémon, é preciso considerar o tipo do oponente, o tipo do ataque, a saúde dos demais Pokémon em campo e outros fatores estratégicos. Cada turno pode ser decisivo. Embora isso estimule o pensamento crítico e a paciência, jogadores acostumados com jogos de ação rápida podem achar essa mecânica desinteressante ou datada.
O combate por turnos e a complexidade dos sistemas

Outro ponto relevante é a curva de aprendizado. Muitos JRPGs apresentam sistemas complexos de progressão, habilidades, equipamentos e personalização. Jogos como Final Fantasy e Persona exigem que o jogador entenda diversas mecânicas para progredir. Para iniciantes, isso pode ser intimidante.
Além disso, há a questão do grind, ou seja, a repetição de batalhas para subir de nível e obter recursos. Essa prática, comum no gênero, pode se tornar monótona e afastar jogadores que preferem avançar na narrativa com mais agilidade.
Como superar esses desafios?

Felizmente, muitos títulos modernos têm buscado tornar os JRPGs mais acessíveis:
- Ajustes de dificuldade e combate acelerado: Diversos jogos oferecem modos de dificuldade variados e opções para acelerar os combates, diminuindo o impacto do grind.
- Tutoriais e guias: A inclusão de tutoriais bem elaborados e o fácil acesso a dicas online facilitam a entrada de novos jogadores.
- Jogos mais amigáveis: Títulos como Ni no Kuni e Persona 5 Royal oferecem uma introdução mais suave ao gênero, com sistemas acessíveis e histórias cativantes.
O caso de Baldur’s Gate 3

Embora não seja um JRPG, Baldur’s Gate 3 é um exemplo atual de como o combate por turnos pode ser adaptado para o público moderno. Desenvolvido pela Larian Studios, o jogo combina um sistema tático complexo com ambientação de mundo aberto e interações dinâmicas.
Cada ação no combate tem peso real, e o uso inteligente do cenário, como empurrar inimigos ou utilizar o terreno a seu favor, torna as batalhas mais interativas. A interface amigável e os tutoriais bem implementados tornam o jogo acessível mesmo para novatos, mostrando que é possível equilibrar profundidade com dinamismo.
A sociedade e o desafio da atenção

Vivemos em uma sociedade cada vez mais marcada pela gratificação instantânea. Vídeos curtos, manchetes rápidas e aplicativos com recompensas imediatas moldaram um perfil de consumo focado na velocidade. Com isso, experiências mais profundas, como as oferecidas pelos JRPGs, tornam-se menos atraentes para muitos.
Porém, essa superficialidade generalizada pode estar nos privando de vivências enriquecedoras. Os JRPGs, com sua ênfase na paciência, estratégia e narrativa, são uma forma de resgatar o valor de experiências mais duradouras e significativas.
Benefícios dos JRPGs e jogos estratégicos

Apesar das críticas, os JRPGs trazem inúmeros benefícios para o desenvolvimento cognitivo e emocional:
- Pensamento crítico e planejamento: Decisões estratégicas constantes fortalecem a capacidade de resolução de problemas.
- Atenção aos detalhes: O foco em fraquezas, itens e histórias estimula memória e concentração.
- Habilidades sociais (em jogos com multiplayer): Aprendizado de cooperação, comunicação e trabalho em equipe.
Recomendações para iniciantes

Para quem deseja iniciar no gênero, alguns títulos recomendados são:
- Ni no Kuni: Wrath of the White Witch – Mistura jogabilidade acessível com narrativa envolvente e visuais encantadores.
- Dragon Quest XI S: Echoes of an Elusive Age – Traz uma experiência clássica e acessível, com ótimo equilíbrio entre combate e narrativa.
- Pokémon FireRed – Ideal para iniciantes, com mecânica simples e estratégica, além do fator nostálgico e divertido.
Conclusão

Embora muitos considerem os JRPGs ultrapassados por causa do combate por turnos e da ênfase em narrativas longas, esses jogos continuam oferecendo experiências ricas, imersivas e intelectualmente desafiadoras. Em um mundo que valoriza cada vez mais a pressa, os JRPGs nos convidam a desacelerar e a redescobrir o prazer de mergulhar em histórias profundas e estratégias bem pensadas.
O desafio está em equilibrar o dinamismo da modernidade com a profundidade dessas experiências. Se conseguirmos fazer isso, os JRPGs continuarão a ocupar um lugar importante no coração dos jogadores – antigos e novos.
Dito isso, encerramos nossa matéria. Até a próxima pessoal!

Esperamos que tenha gostado!
Essa análise é um opinião do autor: Henry Musk.
Editor de texto: Gian Lucca (Player Fox)